publicado em 15/07/2022

TEMA: Foi um AVC, e agora? Não saia do hospital sem saber isso: especificidades do AVC, terapias necessárias e prognóstico.

O que devo saber sobre o Acidente Vascular Cerebral?

Por Letícia Januzi
  • Que tipo de AVC você ou seu parente teve?

A sigla AVC, significa A de Acidente, V de Vascular e C de Cerebral, trocando em miúdos, o AVC é uma doença do vaso sanguíneo de dentro do cérebro. Os vasos sanguíneos são as estruturas que levam sangue para o nosso cérebro, que nada mais é que o alimento para o nosso cérebro. Eu sempre faço um comparativo com o encanamento de uma casa. Ao longo dos anos ou se existe algum problema nesse encanamento nós podemos ter entupimentos ou vazamentos. Transpondo isso para o AVC nós temos as possibilidades do AVC isquêmico, que é quando ocorre um entupimento (obstrução) nesse vaso sanguíneo por gordura ou um coágulo de sangue, por exemplo, e o AVC hemorrágico que é quando ocorre um rompimento neste vaso sanguíneo e o sangue extravasa para o cérebro. Em um caso ou no outro o sangue vai deixar de chegar de maneira adequada para os neurônios do cérebro, que são as células que fazem o cérebro funcionar, e ai o paciente vai ter algum sintoma que nós vamos conversar mais a frente.

 

  • O AVC é uma doença frequente?

Apesar de parecer longe da nossa realidade, antes que ele afete ou aconteça na nossa família, ele é uma doença extremamente frequente: 1 em cada 4 pessoas vai ter um AVC ao longo da vida e a cada 5 min algum brasileiro morre em decorrência do AVC. Apesar desses números assustadores e tristes, é uma doença que tem prevenção e tem tratamento que vem se expandindo cada vez mais no nosso país.

 

  • Quais os principais sinais e sintomas?

Os principais sinais ou sintomas de um AVC são a dificuldade de mexer ao sentir um lado do corpo, incapacidade de entender o que está sendo falado ou de se expressar, a fala enrolada, o desvio da boca ou a incapacidade de andar em linha reta. Os sintomas vão depender de qual área do cérebro foi afetada.

 

  • Qual lado do cérebro foi afetado?  O que isso implica?

Um dos sintomas mais marcantes e por vezes incapacitantes do AVC é a dificuldade de mexer uma parte do corpo, sobretudo se esse for o lado dominante do paciente, ou seja, aquele que o paciente usar para comer ou escrever, por exemplo.

É importante dizer que a maioria das pessoas que a gente conhece tem o lado direito do corpo como dominante, mas quem coordena o lado direito do corpo é o lado esquerdo do cérebro na quase totalidade dos seres humanos. Então é importante que vocês não estranhem quando por exemplo você ou seu familiar tiver dificuldade de mexer o lado direito e o médico afirmar que o AVC foi do lado esquerdo do cérebro.

 

  • O que fazer quando tenho um sintoma de AVC?

Vamos falar um pouquinho agora sobre o que fazer quando a gente tem o sintoma da doença. Então uma coisa importante que devemos quando a gente percebe um sintoma de um AVC é “Não ficar em casa”. Você deve acionar um serviço de ambulância quando a suspeita ou até mesmo levar o seu familiar por conta própria para um hospital que você saiba que tenha atendimento de AVC. É importante que o paciente vá ao hospital porque é nesse ambiente que ele vai ser examinado e ter o diagnóstico confirmado através de exames, principalmente os exames de imagem do cérebro. E isso é importante porque a partir desses exames nós determinamos o tratamento da pessoa.

 

  • E qual o tratamento nessa fase?

Hoje em dia nós temos diversos tratamentos para o AVC. No Isquêmico, a depender da situação nós temos a trombólise, que é a injeção de uma substância na veia do paciente para dissolver o coágulo de sangue ou a trombectomia mecânica, que é a retirada do coágulo através de um cateterismo. E para o AVC hemorrágico, o sangramento nós temos a importância da internação nas unidades de AVC ou UTIS para qua o paciente seja monitorizado, tenha sua pressão arterial controlada e que algumas outras medidas até mesmo a cirurgia seja avaliada pelos médicos. Lógico que estou falando aqui em linhas gerais e que a gente pode discutir um pouco mais sobre isso em outro momento, mas que isso será definido pela equipe hospitalar.

 

  • Contexto hospitalar

Assim que o AVC acontece, na grande maioria dos casos, os pacientes são diagnosticados, investigados e tratados no hospital por uma equipe multidisciplinar. Isso deveria acontecer na quase totalidade dos casos, mas é claro que isso varia até mesmo de acordo com o acesso que cada pessoa tem aos serviços de saúde. O fato é que quando o paciente está no hospital ele é cercado de cuidados e profissionais, mas quando essa pessoa vai para sua casa várias dúvidas podem pairar na sua cabeça e na cabeça dos familiares. A gente vai ter uma aula aqui na semana de AVC que vai falar especificamente sobre o planejamento da alta hospitalar.

 

  • Recuperação e prognóstico

É importante comentar que quando o AVC ocorre e mata a célula do cérebro que a gente comentou que é o neurônio, essa célula ela não se regenera mais, pelo menos até onde a ciência tenha conhecimento.  Mas o nosso cérebro é tão perfeito que ele tem a capacidade de se adaptar um estímulo, que é o que nós chamamos de neuroplasticidade, é como se o nosso cérebro encontrasse novos caminhos para recuperar aquela função que foi perdida. Então não necessariamente a pessoa vai permanecer com os mesmos sintomas que apresentou no contexto agudo ao AVC, normalmente eles se modificam ao longo dos meses, podendo melhorar, piorar ou podendo ter o surgimento de novos sintomas. A recuperação do AVC varia de pessoa para pessoa, é muito individual, e é quase impossível prever, ou seja, não existe uma resposta única para cada pessoa. Mas entender o que acontece durante o processo de recuperação pode ajudar o paciente e o familiar a estarem preparados. Até porque a recuperação no AVC é lenta quando a gente compara com outras doenças.

Os efeitos de um AVC e quanto tempo eles podem durar dependem de vários fatores:

 

1.     Tamanho do AVC: quantidade de neurônios que foi comprometida depois do AVC

2.     Local do AVC: os sintomas podem impactar na recuperação

3.     Tempo: claro que existe a janela de oportunidade que é no primeiro ano do AVC, mas mesmo assim o paciente pode continuar melhorando.

4.     “Esquecer o lado do corpo comprometido pelo AVC”

5.     Individualidade do paciente: memória muscular

6.     Procurar os profissionais adequados para seu caso: qualidade e quantidade de cuidados de saúde

7.     Força de vontade do paciente

8.     Rede de apoio

 

  • Que profissionais devo procurar?

A depender dos sintomas que o paciente tenha após a alta, diversos profissionais podem ser indicados para auxiliar na sua recuperação:

O primeiro que a gente pensa é o Neurologista. O neuro vai ter o papel importante de investigar a causa do AVC e iniciar o tratamento adequado para prevenir que outro AVC aconteça, então vc que teve um AVC não pode ficar sem um neurologista. E é ele que normalmente encaminha o paciente para os outros especialistas.

 

Fisioterapeuta: caso o paciente tenha ficado com dificuldade de mexer alguma parte do corpo ou de andar ou ainda dores no corpo. É bem comum os pacientes que tem dor no ombro (no lado afetado / em recuperação do corpo) e sindrome da dor central (dor inexplicável, sensibilidade à temperatura, sensibilidade à luz e ao toque).

Incontinência urinária

 

Fonoaudiólogo: caso tenha dificuldade na fala, compreensão ou deglutição, que é a capacidade de engolir

 

Nutricionista: caso tenha também dificuldade de engolir (disfagia), ou tenha emagrecido ou esteja com engasgos. Consistencia e sonsa, salivação

 

Psicólogo: caso não esteja ainda aceitando bem o processo de doença, choro ou riso fácil, dificuldade de dormir, ansiedade, depressão ou qualquer outra condição emocional ou comportamental. A perda de memória também é algo frequente e que deve ser avaliada ao longo do seguimento do paciente e pode chegar ao nível de uma demência.

 

To: readaptar às AVDs

 

Educador físico: quando o paciente está um pouco melhor e recuperado e precisa se readaptar às suas atvs.

Existem outros sintomas que podem aparecer como fadiga, espastocidade, encurtamento, salivação excessiva, incontinência urinária, problemas de visão e equilíbrio que devem ser tratados tbm de uma forma multidisciplinar.

 

  • Como impedir um novo AVC?

Algo importante depois que a gente tem um AVC é sempre pensar o que causou aquele evento. Então nós temos os fatores de risco clássicos bem parecidos com o infarto do coração, quais são eles: pressão alta, diabetes, colesterol elevado, sedentarismo, uso de álcool e cigarro, obesidade, uso de alguns hormônios de forma indiscriminada, obesidade, apneia do sono entre outros.

E essas condições podem levar a formação de placas de gordura dentro dos vasos sanguíneos ou problemas de arritmia no coração que fazem com que um coágulo se solte de um vasinho para outro gerando um AVC, então é importante que a gente preste atenção nessas doenças antes de ter um AVC e até mesmo depois porque o mesmo paciente pode ter um novo AVC e isso não é incomum.

 

Espero que esse texto esclareça as principais dúvidas de vocês que estão ai do outro lado e que a gente leve como lição de que é um direito do paciente e familiar ter suas dúvidas esclarecidas e participar ativamente como protagonista do seu processo de recuperação.

Letícia Januzi
Letícia Januzi

Sobre

Atua como médica neurologista especialista em AVC ("derrame cerebral")
Professora da FAMED-UFAL

CRM - AL 5647
RQE 3137

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